A Itália, que durante muito tempo foi dos países mais pró-europeus, num sentido genuíno, virou-se para uma atitude muito diferente. Há evidentemente uma corrente pró-europeia ainda em Itália, mas há uma maioria larga com muitas dúvidas sobre o futuro da Itália na UE.
Nesse sentido como é que a UE pode ajudar a resolver o problema? Ou cabe à Itália sozinha fazê-lo?
A Itália tem a sensação de estar confrontada com uma escolha impossível: para sair da lógica austeritária, devia sair da zona euro. Ou então, para se manter na zona euro, teria de aceitar uma lógica austeritária. A isto eu chamo um dilema impossível. Porque nem uma opção nem a outra são positivas. Isso torna evidente que precisamos de uma terceira opção, transformar a zona euro num espaço que permita de facto investir no futuro e recuperar condições de prosperidade económica e social.Há propostas nesse sentido, por exemplo de criação de uma capacidade orçamental no âmbito da reforma do euro…
Estamos a viver uma crise europeia há sete anos, as soluções estão identificadas. Chegou o momento de fazer o debate de forma organizada e tomar decisões. Esta semana, a Comissão Europeia deverá apresentar, com muito mais detalhe, a proposta que tem vindo a preparar, que é a criação de um embrião de um orçamento da zona euro, expressa basicamente em dois instrumentos. Um é o chamado de apoio às reformas estruturais, e outro deveria ser um instrumento de protecção do investimento. O que está em questão é a possibilidade da zona euro retomar a senda de crescimento, de criação de emprego e convergência económica e social.Na proposta de quadro financeiro plurianual está previsto esse instrumento de estabilização do investimento para proteger os países de choques assimétricos. Sim. Mas temos de estar preparados para a reacção dos actores que vão dizer que não precisamos disso. Vamos ver como é que a Alemanha se clarifica. Se prosseguir na atitude de subestimar este problema, alegando que a crise já está ultrapassada, sem perceber que a arquitectura actual da união económica e monetária continua a limitar os Estados-membros na sua capacidade de investir no futuro e a criar desigualdade económica e social, corremos o risco de ter o que estamos a ter em Itália. E de isso poder espalhar-se a outros países. Países como a Alemanha têm de fazer uma escolha claríssima: ou de uma vez por todas reconhecem que é preciso avançar na reforma da zona euro, ou correm o risco de forças anti-zona euro e anti-europeias ganharem expressão crescente e isso levar à fragmentação da UE.
Temos o Presidente francês, Emmanuel Macron, a aplicar enorme pressão nesse sentido. O ministro da Finanças português e presidente do Eurogrupo a manifestar a esperança de que seja possível completar esse processo da união económica e monetária, com passos decisivos já em Junho. O que explica o impasse, é só a posição da Alemanha?
Temos de ver quais são os actores. Portugal conta para este processo porque temos a presidência do Eurogrupo e também um primeiro-ministro muito activo na cimeira do euro, em Junho.Teremos outros países a apoiarem, mas também temos membros da zona euro que continuam a negar que esta reforma seja urgente. O fiel da balança vai ter de ser a Alemanha, que tem uma responsabilidade central dado o peso da sua economia no futuro da zona euro. E a Alemanha vai chegar a um momento de clarificação.
A chanceler alemã está de visita a Portugal, pensa que essa será uma oportunidade para uma acção diplomática do primeiro-ministro para vencer algumas resistências de Angela Merkel?
Acho que sim. A chanceler, que é também uma política com grande experiência e viveu toda a crise na zona euro, tem de escolher. Ou aceita concretizar um compromisso com a família socialista e social-democrata na Europa, visando uma reforma que permita relançar a zona euro com perspectiva de futuro e coesão, ou corre o risco de ver deflagar na Europa forças anti-zona euro e anti-europeias como as que vemos emergir em Itália — e um pouco por toda a Europa — e têm vindo a reforçar-se. O dilema está claríssimo e ela vai ter de optar.