Maria Joâo Rodrigues
Fonte: Diário de Notícias
Há um ano, algo de muito importante aconteceu: os líderes europeus proclamaram o Pilar Europeu dos Direitos Sociais numa cimeira social que teve lugar em Gotemburgo, na Suécia
Foi a primeira vez em 20 anos que uma cimeira reuniu os presidentes de todas as instituições da União Europeia e os Chefes de Estado e de governo dos 28 Estados membros em torno de assuntos sociais; um encontro de natureza semelhante só tinha acontecido uma outra vez, aquando da proclamação da Carta Europeia dos Direitos Fundamentais.
O texto final da proclamação não é tão ambicioso quanto o meu relatório no Parlamento Europeu, mas, ainda assim, marcou o início de um processo político de reforço da dimensão social europeia, envolvendo nova legislação, políticas sociais e instrumentos financeiros.
As expectativas em relação ao Pilar Social são altas: restabelecer a ligação com os cidadãos e reequilibrar o processo de integração europeia, através de uma maior preocupação com a dimensão social. O objetivo é atualizar os padrões sociais de modo a que possam enfrentar novos desafios, tais como a concorrência global, o envelhecimento populacional, a transição energética, a revolução digital, a gestão das migrações e, por último, mas não menos importante, superar as profundas desigualdades sociais e regionais criadas pela recente crise financeira da zona euro.
O caminho que levou à proclamação do Pilar Social estava cheio de obstáculos, colocados, sobretudo, pelos partidos conservadores e por interesses nacionalistas; mas os esforços de uma coligação de forças políticas progressistas lideradas pelos socialistas e democratas, e de uma grande aliança de parceiros sociais e outros elementos da sociedade civil, levaram a tarefa a bom porto.
Mas onde nos encontramos neste momento em termos destes compromissos de alto nível?
Estão a decorrer negociações em relação a várias propostas legislativas e outras ferramentas fundamentais para a implementação do Pilar Social, e os debates com os partidos conservadores continuam a ser extremamente difíceis. O exemplo mais recente é a votação que teve lugar na última sessão plenária do Parlamento Europeu em Estrasburgo: apesar da oposição dos grupos PPE e CRE, conseguimos aprovar o mandato para dar início às negociações interinstitucionais da proposta de Diretiva sobre Condições de Trabalho Transparentes e Previsíveis, uma iniciativa legislativa muito importante para melhorar as condições de trabalho, garantindo a todos os trabalhadores na Europa um contrato de trabalho decente e o acesso à proteção social.
Outras decisões legislativas importantes encontram-se em cima da mesa: a iniciativa relativa à conciliação das vidas familiar e profissional de progenitores e cuidadores, a reforma das regras de coordenação dos sistemas de segurança social e a criação da Autoridade Europeia do Trabalho.
No entanto, a possibilidade de melhorar os padrões sociais também depende da mudança de políticas sociais e económicas, no âmbito do chamado Semestre Europeu. O estabelecimento de um painel de indicadores sociais para monitorizar o desempenho dos Estados membros na implementação do Pilar Social Europeu foi o primeiro passo nesta direção. A sua utilização no âmbito dos relatórios nacionais para analisar o desemprego e outros problemas sociais levou os Estados membros a apresentar novas medidas concretas nos seus Programas Nacionais de Reforma. Mas estas medidas devem também ser traduzidas nos orçamentos nacionais; e, aqui, outro problema está a emergir: terão os governos nacionais margem orçamental para financiar o investimento social? Ainda que a flexibilidade recentemente introduzida no Pacto de Estabilidade e Crescimento estabeleça uma pequena margem de manobra, isto não é suficiente.
É por isso que o Pilar Social foi concebido para exigir instrumentos financeiros europeus mais fortes, complementando os recursos nacionais. Isto levou a uma reformulação do Fundo Social no próximo Quadro Financeiro Plurianual 2021-27 e traduziu-se no quadro do novo Plano Europeu de Investimento, que foi alargado de forma a incluir o investimento social, nomeadamente em educação, formação e infraestruturas sociais. Além disso, o novo Fundo de Globalização responderá também a choques competitivos e reestruturações provocados pela revolução digital. Por último, mas não menos importante, um orçamento específico para a zona euro está agora a ser proposto, para apoiar a convergência económica e social ascendente através do financiamento de reformas e investimentos, incluindo em inovação e educação.
Como é que isto tudo pode ser financiado? A discussão atual sobre a introdução de novas fontes de tributação é fundamental para responder a esta pergunta. Estes novos impostos não devem penalizar os cidadãos, mas sim taxar a poluição, as transações financeiras ou o valor acrescentado gerado pela indústria digital, que paga impostos extremamente baixos ao operar no mercado único europeu.
Esta é a nova dinâmica política criada pelo Pilar Social Europeu, mas o progresso atual não é ainda suficiente. Cabe agora à Comissão Europeia e ao Conselho acelerar as negociações e superar os desafios, de forma a cumprir as promessas feitas em Gotemburgo: construir uma Europa mais justa e reforçar a dimensão social da União Europeia – e assim provar que a União Europeia é capaz de proteger os seus cidadãos! – antes das eleições europeia de 2019. Continuemos, pois, a relembrar aos Estados membros que têm de honrar os seus próprios compromissos!