Article published in Público.pt by Ritza Siza on September 11th about the State of the Union
Uma Europa que protege precisa de uma força de polícia de fronteiras, defende Juncker
Presidente da Comissão Europeia faz o seu derradeiro discurso do Estado da União esta quarta-feira em Estrasburgo
O detalhe das propostas concretas ainda não é conhecido, mas não há grande mistério sobre qual será o conteúdo político do derradeiro discurso de Jean-Claude Juncker sobre o Estado da União, esta quarta-feira no plenário do Parlamento Europeu em Estrasburgo. “Podem esperar um grande ênfase na narrativa sobre a Europa que protege”, avançou o porta-voz do presidente da Comissão Europeia, sem confirmar que Juncker se prepara para propor o fortalecimento das competências e do mandato da Guarda Costeira e de Fronteiras, para a converter numa verdadeira força de polícia europeia.
Sem abrir muito o jogo, fontes que participaram nas discussões preparatórias do discurso com Juncker disseram ao PÚBLICO que, na sua intervenção, o presidente da Comissão insistirá na necessidade — e urgência — de ver aprovadas medidas para resolver aquele que constitui, no momento, o principal desafio e a maior dor de cabeça da Europa: a gestão das fronteiras externas e o acolhimento e integração de refugiados. Essas são as duas faces de uma moeda que também simboliza as crises migratória e política, cujo impacto tem estado a alterar profundamente a paisagem política europeia.
Nos seus esforços para acalmar o ímpeto dos populistas, a estratégia da Comissão parece basear-se no princípio de que se não podes vencê-los, junta-te a eles: sob a pressão dos líderes que, do Norte ao Sul da Europa, parecem alimentar-se da reacção popular à entrada de migrantes, e em contra-relógio para as eleições europeias de Maio de 2019, as maiores novidades têm a ver com as questões migratórias e com a democracia europeia — o combate à difusão de fake news nas redes sociais, a salvaguarda da integridade dos processos eleitorais e a reforma das regras de funcionamento das instituições, por exemplo com o fim das decisões por unanimidade.
Como avançou o diário espanhol El País, Juncker vai defender a federalização da actual guarda costeira e de fronteiras, para que esta passe a operar num sistema único “com capacidade de vigilância em território europeu, possibilidade de intervir em países terceiros e poderes para participar nas operações de devolução de irregulares”. A ideia não é nova, mas a Comissão nunca tinha insistido nela por causa da feroz oposição de alguns dos Estados membros (que continuam a ser contra esta hipótese).
Maria João Rodrigues, a política portuguesa que tem estado presente nos principais momentos da construção europeia, não encara o último debate sobre o Estado da União desta legislatura como um, mas avisa que “estamos numa corrida contra o tempo” em termos do desenvolvimento do projecto da UE. “Este último debate é um momento chave para se poder definir até onde as instituições podem levar por diante as ambições europeias até as eleições em Maio”, diz a eurodeputada socialista, em conversa com o PÚBLICO.
Rodrigues acredita que as instituições europeias ainda têm tempo, até às eleições europeias, de concluir os principais dossiers que têm em mãos, e em especial aqueles cujas soluções “já foram trabalhadas ao pormenor” mas continuam a arrastar-se, como por exemplo a reforma da união económica e monetária, com a constituição de uma capacidade orçamental própria da zona euro para suportar reformas estruturais. “Estamos numa situação em que só falta a vontade política”, notou.
O que pediu a Juncker dias antes do debate, revelou, foi para que ele cuidasse para que todos os esforços nesta recta final do mandato fossem no sentido de “dotar a UE de instrumentos mais fortes de influência sobre o quadro global mundial”, sobretudo em temas que são vitais para os europeus, como a resposta às alterações climáticas, a negociação de acordos comerciais e a governação democrática da Internet.
A previsível tónica nas questões ligadas à gestão da imigração é, para Maria João Rodrigues, ajustada, e a eurodeputada espera que a Comissão “apareça com soluções mais precisas para concretizar uma estratégia de conjunto sem a qual este problema não tem solução”. Nessa estratégia coloca a promoção do desenvolvimento dos países de origem de imigração, nomeadamente a cooperação com África, a gestão — ao nível europeu e não nacional — das fronteiras externas da UE, e a criação de um sistema de asilo europeu para além de Dublin. “Ele é imprescindível e tem de ser criado”, defende.
Para além de oferecer propostas concretas, o discurso do Estado da União servirá para fazer um balanço da agenda política da Comissão, projectando os desafios do futuro. Será nesse momento que Juncker tentará contrariar o discurso negativo sobre a Europa, e devolver confiança e esperança aos eleitores europeus.