Portugal enfrenta neste momento desafios que vão para além do que pode ser resolvido pelos fundos estruturais.
Uma análise centrada nos fundos de coesão não chega
Maria João Rodrigues
As negociações do novo Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021-2027 têm particular relevância pois estão a ter lugar num momento em que se aproximam eleições Europeias. Para além disso, estamos num contexto em que a UE enfrenta desafios internos, bem como desafios nas suas relações externas: persistentes desigualdades regionais, divergência económica, pressões migratórias, conflitos militares e mudanças geopolíticas, riscos para a democracia e estado de direito, aumento do protecionismo como resposta a efeitos da globalização, uma rápida digitalização com impacto nas novas formas de trabalho, alterações climáticas e escassez de recursos, alterações demográficas, a necessidade de estabilizar e reformar a zona euro e, ainda, o Brexit.
A negociação deste novo QFP é um jogo de xadrez extremamente complicado e Portugal para maximizar os resultados no final destas negociações, deve negociar em várias frentes.
Os Fundos Estruturais representam a maior fatia do orçamento comunitário e têm tido para Portugal um papel extremamente relevante como motor de desenvolvimento económico, promotor de investimento e apoio a políticas de âmbito social. Portugal deve ser a favor da modernização destas políticas, incluindo o foco em políticas que promovam a competitividade e a coesão. Os fundos estruturais devem continuar a apoiar investimentos estratégicos no nosso país, o fundo social deve ser desenhado de modo a poder apoiar os desafios sociais e laborais que enfrentamos e os fundos destinados à agricultura e recursos marítimos devem ser baseados em políticas de desenvolvimento sustentáveis.
Apesar do peso dos fundos estruturais como motor de investimento no nosso País, Portugal ainda não recuperou o seu nível de investimento para níveis pré-crise. Programas europeus de apoio ao investimento como InvestEU ganham uma relevância particular. Este programa é baseado no atual Plano Juncker e Portugal, neste momento, é o 4º país com maior volume de investimento em relação ao PIB. Desde a sua criação em 2015, Portugal já conseguiu mobilizar investimentos adicionais acima de sete mil milhões de euros. Uma utilização eficiente e inteligente baseada na experiência adquirida até à data deste programa comunitário por parte de Portugal pode potenciar, no mesmo período de tempo, a mobilização de investimento em montantes crescentes e próximos dos que são destinados a Portugal em fundos estruturais.
Outra frente de negociação prende-se com os Programas comunitários geridos pela Comissão Europeia tais como o Horizonte Europa, Europa Digital ou o Fundo Europeu de Globalização. Estes programas devem ter em consideração critérios ajustados aos desafios que enfrentamos, de modo a potenciar o acesso de Portugal; por exemplo, assegurar que o Fundo Europeu de Globalização abrange em termos de elegibilidade os impactos devidos à revolução digital é um exemplo no qual Portugal poderia tirar partido deste Programa.
Entre as novidades desta proposta de orçamento contam-se finalmente os instrumentos orçamentais para a Zona Euro. A proposta da Comissão tem particular relevância pois iria dotar a Zona Euro de uma capacidade orçamental própria. A Zona Euro é a única zona monetária no mundo que não está dotada dessa capacidade. A criação destes instrumentos permitiria a Portugal por um lado vir a ser apoiado financeiramente na implementação de certas reformas e investimentos conexos. Para além disso, a criação de uma capacidade orçamental na Zona Euro permitiria apoiar os países a estabilizar os seus níveis de investimento em caso de uma nova crise financeira e económica. Estes instrumentos são cruciais para tornar a zona euro e Portugal uma economia mais resistente a choques e sustentáveis a prazo. Mas vamos ver se há condições políticas para lançar estes instrumentos inovadores. Há um grupo de Estados-Membros, dito Hanseático que ainda resiste e a Alemanha hesita.
Em qualquer caso, devemos pôr de lado esta visão míope de nos focarmos somente nos fundos estruturais quando analisamos os resultados destas negociações. Portugal enfrenta neste momento desafios que vão para além do que pode ser resolvido pelos fundos estruturais. Uma análise centrada nos fundos de coesão não chega. Portugal tem muito mais a ganhar quando se tem em consideração a variedade de programas comunitários ao nosso dispor neste novo QFP.
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